segunda-feira, 23 de julho de 2012

Obras causam polêmica em Itaparica

Obras causam polêmica em Itaparica



 
Obras em espaços públicos vêm mudando Itaparica. A cidade faz parte da história de Independência e tem como seu “centro histórico” tombado em nível nacional como conjunto Arquitetônico e Paisagístico, desde 1980. Como estância hidromineral, é famosa pela água da Bica e é lugar tradicional de veraneio.
“Servidão” de mais de 300 anos, a Bica, cuja “água fina faz velha virar menina”, sem tombamento federal, estadual, nem municipal, teve o calçamento reformado.  Foram feitos quiosques de souvenirs, chuveiros públicos reposicionados e pontos de carregamentos de barris suprimidos. Novas torneiras para coleta foram acrescentadas.
João Icó da Silva Neto, 74 anos, lembra da Bica de antes das reformas porque foi vendedor de água, quando o transporte de barris era feito nas cangalhas dos jegues, que iam encher  os porões de barro que serviam de reservatórios das casas.
“ O serviço está malfeito, falta higiene”, avalia João Icó, ao reparar os ralos entupidos sob as torneiras, no local de encher os copos.” Se fosse histórico, tinha que deixar como era”, observou. Ele mostra também as modificações das construções que mudaram a paisagem da área.
 
As alterações no entorno da Igreja Matriz do Santíssimo do Sacramento, tombada, consistem na substituição dos paralelepípedos por um piso de cimento intertravado como de novas praças de Salvador e na colocação de um parque infantil em frente à igreja do século 18.
Na praça da Quitanda “tiraram o calçamento que nem tinha pedra que tivesse folgada e colocaram esse concreto com se fosse a melhor coisa do mundo”,  critica Gregório Gomes, escritor comerciante e conhecedor das história de Itaparica. “O Siribóia (bar) era uma barbearia, ali era o armazém, o prédio da sorveteria foi a coletoria estadual”, apontou.
Solar
A preocupação agora é se depois da reforma no Solar Tenente João das Botas, sob a responsabilidade da Companhia de Desenvolvimento Urbano (Conder), os comerciantes permanecerão. “Ainda não informam. Somente os Correios foram notificados” disse Renato Souza, dono há 29 anos de um boxe, junto aos de Tânia Oliveira e Raimunda da Silva.
As alterações na região começaram com a inauguração de uma Marina, com capacidade para 70 embarcações em 2001. Administrada pela Conder e que, segundo críticos da construção, passou a obstruir a visão do mar.

Espaço privado
“As obras são feitas às pressas, sem critério. Assim se perde o diferencial da cidade. É o fenômeno de massificação” disse Dante Galeffi, professor universitário e veranista. A marina passou por cima do bom-senso. O poder se apropriou de um espaço público e transformou-o em privado. A comunidade não tem consciência do que se reivindicar”, analisou Galeffi. O também escritor João Ubaldo tem recebido queixa sobra as mudanças. Ele reclama da tentativa de aproximar a estética e os problemas de Salvador aos de Itaparica. E alerta que o turismo mais sofisticado hoje tem direção contrária de valorização da cultura local.
A Conder argumenta que a intenção de suas iniciativas é das melhores. “Nós tínhamos, um projeto do governo passado muito mais agressivo, em termos de pavimentação, de desenho, enfim, era uma coisa absurda”, explica Lívia Gabrielli, diretora de Qualificação Urbanistica da Conder. Ainda de acordo com ela, “ninguém que estava dentro do processo achava aquele projeto viável, pois mascarava a Bica, descaracterizava o conjunto arquitetônico”. E o projeto foi aprovado pelos moradores e pela prefeitura, por exigência do Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (Prodetur).
Sobre a marina, Gabrielli diz que os arquitetos foram Ivan Smarcevski (filho de Lev saverista)e Aleixo Belov, velejador. Segundo a gestora, os comerciantes do Solar João das Botas não serão afetados pela reforma que será estritamente estrutural.
Intervenções são possíveis, mas sem alterar o conjunto, diz técnico

As obras no entorno da Igreja do Santíssimo Sacramento foram propostas pela Conder e autorizadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), de acordo  com o decreto lei n 25/37.  O coordenador-técnico Bruno Tavares informa que as obras de mudança do piso e dos equipamentos  que compõem a vizinhança da igreja não estão sujeitas à orientação do órgão.
“A proposta de requalificação foi apresentada para espaços do Centro Histórico de Itaparica e para alguns trechos da vizinhança tombada. A intervenção envolveu a fonte que não tem proteção”, informou. “ A questão do piso em Itaparica é parecida com a da Barra, na orla de Salvador. O objeto de proteção não é o piso. O que está protegido é um trecho do Conjunto Arquitetônico”, identificou.
Recursos
“O que o Iphan ponderou na ocasião é que a substituição não interferiria no objeto tombado. Não tem que ficar intacto como era. Você não tem interferência tão grande que cause dano à compreensão do conjunto”, disse o técnico Bruno Tavares.
A diretora da Conder Lívia Gabrielli informa que as obras da Bica e do entorno da Igreja do Santíssimo Sacramento custaram R$ 934 mil, provenientes do Prodetur ( do Banco Interamericano de Desenvolvimento –BID e do Governo do Estado). Os recursos não cobrem o custo do projeto que foi desenhado por um arquiteto da Conder. Já o investimento do casarão João das Botas é do próprio governo do Estado.
O professor da Pós- Graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Ufba, ex-presidente do conselho de cultura do Estado e morador de Itaparica Pasqualino Magnavita diz que preservar o que é tombado, sem se preocupar com a qualidade dos espaços que preexistem em torno deles torna-se impensável. “Considero a intervenção lamentável, pela composição do projeto, que deveria revelar valores simbólicos e funcionais, e não o parque infantil, por exemplo, que poderia estar no Campo Formoso”. Fonte: Atarde Fotos: Thadeu Brasileiro

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